Sempre defendeu que o ciclo de dois mandatos autárquicos seria o suficiente para cumprir o projeto de cidade que foi validado pela maioria dos portuenses. Mas a verdade é que se atravessou pelo meio uma pandemia que não estava nos planos.
Esse facto alterou em muito as circunstâncias, nomeadamente no calendário das obras, reconhece Rui Moreira. “Queria acabar as obras do Bolhão, que já teriam terminado se não fosse a pandemia. Quero acabar o Terminal Intermodal de Campanhã, uma velha promessa que está quase pronta. Antes do fim do ano teremos também o Cinema Batalha. Já vi o início as obras do Matadouro Municipal, o grande projeto para Campanhã que vai mudar a face da zona oriental”, elencou o presidente da Câmara que, por outro lado, regozijou-se por já ter podido restituir o Pavilhão Rosa Mota à cidade, ou por, muito recentemente (ao dia de ontem), ter sido aprovado o novo PDM – Plano Diretor Municipal.
Por isso, avança que está a refletir sobre um novo ciclo de liderança à frente da cidade do Porto. “Estou a avaliar se devo ou não concorrer. Quando ouço o único candidato importante, preocupa-me que não tenha essas preocupações. Não queria deixar que as coisas fossem deitadas a perder”, sublinhou.
Na conversa com a veterana Fátima Torres (pode vê-la aqui na íntegra), Rui Moreira foi convidado a fazer uma retrospetiva da sua governação, incidindo, sobretudo, essa avaliação no primeiro mandato autárquico, em que o Porto, pela primeira vez, elegeu um candidato independente, sem partido político, impondo, de forma irreversível, um novo xadrez político no mapa do poder local em Portugal, e que a Europa também acompanhou interessada.
“O que correu melhor foi a questão da cultura. Não me conformava com facto de o Porto ter virado as costas à cultura, porque entendeu-a como o cimento da nossa sociedade”, assinalou. “É uma tradição da cidade do Porto. A cidade do Porto é a cidade do Coliseu, do Rivoli, do Teatro São João, da Casa da Música, de Serralves, dos grandes músicos da atualidade e de outros anteriores, dos poetas e escritores. E o Porto tinha virado as costas a isso por culpa de uma opção política da cidade”, observou Rui Moreira, adiantando ter sido essa uma das principais razões que o motivou a candidatar-se à Câmara do Porto.
Depois da Porto 2001 (período que entende não ter sido aproveitado da melhor forma, porque os portuenses sempre o associaram a um longo período de obras), o presidente da Câmara acha que a cidade “se virou para dentro”. “Queria que o Porto voltasse a ter cultura, mas que fosse mais transversal e democrática, em que passássemos não apenas a ser espetadores, mas também atores”, esclareceu.
Conseguiu-o através de programas como o Cultura em Expansão que, de forma descontraída e descomprometida, levou a cultura aos bairros municipais, adotando o princípio de cidade policêntrica que sempre defendeu.
Sob a égide de Paulo Cunha e Silva, desenvolveu-se, também, o festival do pensamento contemporâneo Fórum do Futuro. Reataram-se relações institucionais “com os artistas, as associações culturais, mas também com a presença em Serralves, na Casa da Música, com a relação que construímos com o Teatro Nacional São João (TNSJ), e com algumas estruturas que estavam absolutamente abandonadas, como Teatro Experimental do Porto (TEP)”, além do apoio dado a inúmeros festivais. “Acho que foi um sinal de grande mudança”, analisou.
Em matéria financeira, Rui Moreira reconheceu na entrevista o trabalho feito pelo seu antecessor, mas concentrou-se no seu ao longo dos últimos sete anos e meio. “Continuamos a consolidar as contas. Encontrei a Câmara com 100 milhões de euros de dívida e no final do ano passado estava a zeros. E, mesmo assim, conseguimos dedicar 6 a 8% à cultura no orçamento”, vincou, acrescentando que entende a cultura como um investimento “desde a criança até à pessoa da terceira idade”.
No campo da habitação, o presidente da Câmara do Porto tem igualmente obra feita. “O Porto pode gabar-se de ser hoje a cidade que mais investe em habitação social”, realçando, a este respeito, que a melhoria das condições em habitação social passou a ser encarada não por reação à degradação do edificado, mas seguindo uma estratégia preventiva de manutenção dos bairros.
“No primeiro mandato, em 2013, vivia-se uma situação muito penosa, tinha havido a crise financeira. Programas como o Porto Solidário, de apoio às rendas, e o apoio às instituições de solidariedade social foram muito importantes para a cidade poder respirar”, continuou, em jeito de balanço. “Era importante que estas instituições que nascem da sociedade civil tivessem o apoio da Câmara Municipal do Porto, e acho que tiveram e isso é reconhecido”.
Questionado sobre o tema emigração, Rui Moreira disse que não o entende como um problema, e deu como exemplo a intervenção que, ainda ontem, ouviu do deputado municipal do PSD que é presidente da Junta de Freguesia de Paranhos, em que “manifestava preocupação por 5% da população do Porto ser estrangeira”, partilhou. “Ora não vejo mal nenhum, acho ótimo. As cidades não devem ter medo. A única coisa que não devem fazer é deixarem-se aculturar. Se tivermos uma cultura forte, quem vem para cá viver passa a ter o mesmo sentimento de pertença e passa a ser um portuense”, sublinhou, lembrando que a toponímia da cidade do Porto está repleta de exemplos de nomes com origem estrangeira.
“A cidade deve ser o ponto de encontro, desde que sejamos suficientemente cosmopolitas. O cosmopolitismo não é absorver os hábitos dos outros, é termos esta visão aberta que permite que os outros se sintam em casa”, concluiu.
Na entrevista foram ainda abordados alguns outros temas da atualidade, nomeadamente o São João, a final da Liga dos Campeões, a forma como o país se tem dividido no combate à pandemia, ou ainda o processo judicial de que está a ser alvo, e que, segundo um munícipe entrevistado na rua para o programa, “não passa de uma manobra de diversão”.