No passado mês de julho, a Associação Cívica já havia alertado para a aprovação, no Parlamento, das “alterações cirúrgicas” à lei eleitoral autárquica, com os votos favoráveis do bloco central, PS e PSD. E Rui Moreira escreveu também ao Presidente da República ainda antes da promulgação da lei.
Que o PSD tenha proposto isto não nos pode admirar. Já durante a última campanha tentou, sem sucesso, impedir que o nosso Movimento Independente se apresentasse a eleições com o nome “Rui Moreira: Porto, o Nosso Partido”. O tribunal não lhe deu razão, aprovando as listas, designação, sigla e símbolo da nossa candidatura à Câmara.
“Recordo que, relativamente a esta matéria, durante a última campanha eleitoral, o PSD aqui no Porto tentou, pela via judicial, impedir a minha candidatura com base nestes argumentos. Como não conseguiram, na altura quiseram ganhar na secretaria, mas não conseguiram, agora mudaram a lei”, afirmou hoje Rui Moreira, em declarações à comunicação social.
“De facto, a forma como a lei está formulada, principalmente a questão do nome dos movimentos, acho que basta para perceber que isto nos foi apontado. A mim, em particular. Se ao mesmo tempo perceberem de quem veio a iniciativa, e que essa mesma pessoa que tomou essa iniciativa tinha tentado fazê-lo, como digo, na secretaria, em 2017, durante a campanha eleitoral, tentando inviabilizar a minha candidatura”, continuou.
Com a aprovação da nova lei, a que também o reputado intelectual português, Carlos Fiolhais, chamou de “batota”, o centrão encontra aqui o espaldo para, finalmente – como sempre quis mas nunca teve coragem de abertamente o dizer – de manietar os movimentos de cidadãos independentes.
“Eu considero que a lei é inconstitucional, mas esse tema não foi suscitado no Parlamento, não foi suscitado pelo senhor Presidente da República, que o poderia ter feito. Sei que a senhora Provedora [de Justiça] estará a avaliar essa questão, mas teria que ser o Tribunal Constitucional depois a decidir”, embora Rui Moreira considere que não haja tempo para que este órgão judicial decida em tempo útil, mesmo que a data das eleições autárquicas possa ser adiada, devido à pandemia.
“Acho que a democracia é mais forte e aguenta estes ataques”
A Associação Cívica – Porto, o Nosso Movimento não está sozinha nestas críticas. De norte a sul do país autarcas independentes contestam revisão da lei autárquica cozinhada pelo “centrão”.
“Eu tenho falado com vários colegas meus, candidatos autárquicos e eleitos autárquicos, presidentes de câmara. O que está a acontecer é que os partidos políticos, tendo criado esta dificuldade, agora têm vindo falar com eles a perguntar se eles por acaso não querem incluir as listas desses partidos. Devo já dizer que não será o meu caso”, assinalou esta manhã Rui Moreira.
“Andamos sempre a dizer que queremos que as pessoas se mobilizem pela cidadania, que o envolvimento das pessoas em candidaturas, na política, são coisas legítimas e desejáveis para a democracia. Se depois lhes fazemos estas partidas, aquilo que levamos é que a pessoa desinteressa-se, é o desamor pela política e pela participação cívica. E isto tem consequências, desde logo naquela coisa que em todas as noites eleitorais ouvimos os partidos chorar: a abstenção”, sublinhou ainda o presidente independente da Câmara do Porto.
“Acho que a democracia é mais forte e aguenta estes ataques, não sendo propriamente um ataque à democracia. Acho, acima de tudo, que é reduzir a capacidade de intervenção dos cidadãos na vida pública e na vida política do país E isso é absolutamente lamentável e a meu ver contraria tudo aquilo que os partidos têm dito”
Para Rui Moreira, e também para a Associação Cívica, a conclusão só pode ser uma: “O sistema partidário tem medo dos movimentos independentes”.
O que muda com a nova lei
O Porto, o Nosso Movimento reproduz as quatro maiores dificuldades criadas pela nova lei, hoje identificadas num artigo publicado pelo Jornal de Notícias, intitulado “Independentes em risco de ‘perder’ antes de irem a votos”:
– Recolha de assinaturas
Um grupo de cidadãos tem que recolher um número de assinaturas equivalente a 3% dos eleitores do concelho para concorrer à Câmara e à Assembleia Municipal e mais 3% por cada freguesia a que vá a votos.
No rosto de cada propositura, tem que constar o nome do movimento e a lista completa ao órgão autárquico. As assinaturas têm que ser entregues no Tribunal da Comarca, por ordem alfabética.
– Autenticação
Até às alterações aprovadas a 23 de julho, um juiz podia pedir, se assim o entendesse, a autenticação das assinaturas. Agora é obrigado a fazê-lo. A lei eleitoral, não dita, porém, qual a quantidade. Ou seja, um juiz até pode pedir que todas assinaturas sejam reconhecidas em notário.
– Freguesias vedadas
Com as alterações à lei, um movimento tem que usar nomes distintos nas candidaturas à Câmara e Assembleia Municipal e na lista à Junta de Freguesia.
Esta lista fica impedida de receber apoios públicos para a campanha, pois as subvenções são fixadas segundo os resultados obtidos na corrida à Assembleia Municipal.
– Financiamento
Os grupos de cidadãos são forçados a terem um número de identificação fiscal (NIF) provisório, cujo pedido e extinção custa 100 euros. Como o NIF é provisório não conseguem empréstimos bancários. E, ao contrário dos partidos, pagam IVA a 23%.